“Fui reprovada e achava que a culpa era minha”, conta estudante de Baraúna, RN
Felizmente, a estratégia para recuperar o atraso escolar funcionou e Alcilene, de 14 anos, aprendeu a ler, foi aprovada e avançou nos estudos.
A sensação de Alcilene era de ter fracassado. “Ser reprovada foi uma coisa muito triste para mim, eu achava que a culpa era minha”, contou a estudante de 14 anos, que mora em um distrito rural quilombola em Baraúna, no interior do Rio Grande do Norte. Aos 13 anos, havia sido reprovada no sexto ano, ainda sem ter sido alfabetizada. Ela não sabia ler e não entendia o que os professores e professoras explicavam. “Todo mundo passava, porque sabiam ler e responder as perguntas das provas e eu não sabia. Eu não me interessava em aprender a ler e escrever”, lembra a adolescente.
“Se falta interesse (do estudante), os professores, a gestão, a escola e a comunidade escolar estão trabalhando para que esse aluno tenha interesse? A escola está chegando até ele e ela para mostrar que são capazes?”, questiona Anderson Dias, professor de inglês e português na Escola Municipal Manoel de Barros, em Baraúna. “A responsabilidade não se restringe só ao aluno”.
Foi Anderson quem notou que Alcilene precisava de apoio adicional. Felizmente, a escola participava do projeto Caminhos de Aprendizagens - Avexadas para Aprender, programa estadual que está sendo implementado em regime de colaboração com os municípios do Rio Grande do Norte, a partir das recomendações da estratégia Trajetórias de Sucesso Escolar, uma iniciativa do UNICEF e parceiros para o enfrentamento da cultura de fracasso escolar no Brasil.
Isso significa que o município de Baraúna se fortaleceu para identificar estudantes em atraso escolar de dois ou mais anos e uniu esforços para retomada da aprendizagem para meninas e meninos em situação distorção idade-série. Na prática, gestores municipais participaram de capacitações técnicas realizadas pelo UNICEF e parceiros, criaram uma coordenação municipal específica para o tema, e multiplicaram as capacitações para professores da rede municipal – como na escola onde Alcilene estuda e Anderson dá aulas.
Toda criança consegue aprender
O professor lembra com orgulho da trajetória de Alcilene durante o ano de 2023, quando, por orientação da Secretaria de Educação, ela foi matriculada em uma turma especial do Avexadas. “Ela participava de toda a programação da escola e projetos, mas não estava sendo vista como aluna ou como os demais que sabiam ler. Ela não sabia ler, nem escrever, conhecia poucas letras. Se Alcilene ficasse no sexto ano regular, eu tenho certeza de que ela seria reprovada e ficaria mais um ano em atraso escolar”, lembra o professor.
Anderson e a escola então começaram a trabalhar com práticas pedagógicas adaptadas à realidade de Alcilene, e ela teve novas opções para avançar na aprendizagem e seguir em frente. “A gente tenta fazer um trabalho que desperte a autoestima, que desperte neles a vontade de aprender, esse acreditar em si mesmo. Que eles conseguem, que eles podem avançar, que eles podem aprender”, diz o professor.
A trajetória de Alcilene foi transformada com o esforço conjunto do governo e da comunidade escolar para conhecer a fundo o problema, debater as diversas visões e enfrentar a cultura do fracasso escolar. A escola se constitui em espaço seguro e de acolhimento onde se conheceu, se debateu, se construiu e se reconstruiu conhecimentos sem ameaças ou pré-conceitos, culminando para a recuperação das aprendizagens e avanço nos estudos da adolescente.
Sobre o futuro, Alcilene é otimista e repleta de sonhos. Quer ser professora. “Eu vi os professores me ajudando a aprender a ler e senti vontade de ser que nem eles e ajudar outras pessoas também aprender a ler”.
Sobre a estratégia Trajetórias de Sucesso Escolar
A estratégia Trajetórias de Sucesso Escolar é uma iniciativa do UNICEF e parceiros para o enfrentamento da cultura de fracasso escolar no Brasil. O objetivo é facilitar um diagnóstico amplo sobre a distorção idade-série e o fracasso escolar no País, e oferecer um conjunto de recomendações para o desenvolvimento de políticas educacionais que promovam o acesso à educação, a permanência na escola e a aprendizagem desses estudantes.
O site da estratégia disponibiliza materiais pedagógicos – como as experiências didáticas –, textos, vídeos e dados relativos às taxas de distorção, abandono escolar e reprovação, com recortes por gênero, raça e localidade, que mostram as relações entre o atraso escolar e as desigualdades brasileiras. Para a iniciativa, o UNICEF conta com a parceria do Instituto Claro, Grupo Profarma e Itaú Social.
Texto: UNICEF Brasil
Fotos: UNICEF/BRZ/Manoel Alvares