“A Busca Ativa Escolar é o nosso carro chefe”, diz secretária da Educação de Moju

O município paraense desenvolve ações de enfrentamento à evasão escolar há quase 20 anos; chamado de Batelão da Educação, as escolas municipais realizam caminhadas nas comunidades para celebrar o dia D da Busca Ativa Escolar
Em Moju (PA), a Busca Ativa Escolar (BAE) é um eixo norteador de todas as frentes de trabalho da Secretaria Municipal de Educação (Semed). “A BAE é o nosso carro chefe! Sem aluno na escola, não há por quê para estarmos aqui trabalhando”, explica Sandra Helena Ataíde de Lima, responsável pela pasta no município.
As ações de busca ativa no município tiveram início há quase 20 anos, com a ajuda do escritório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em Belém, capital do estado, e da seccional da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação no Pará (Undime PA). Mais tarde, quando o UNICEF, em parceria com a Undime e o apoio do Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social (Congemas) e do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), criou uma metodologia e uma ferramenta tecnológica de enfrentamento à evasão escolar no Brasil, a cidade logo aderiu à estratégia.
“A Busca Ativa Escolar é tão importante para nós que o nosso programa (de enfrentamento ao abandono escolar), o Batelão da Educação, vem dizendo – na sua apresentação – que é uma iniciativa incentivada e baseada na estratégia do UNICEF.”, destaca a secretária municipal de Educação.
Na cidade paraense, que fica há cerca de duas horas de carro de Belém, há atualmente 18 mil alunos matriculados em 172 escolas da rede municipal de ensino, sendo que dois mil deles foram matriculados entre janeiro e fevereiro deste ano, graças às ações da BAE. “Aproximadamente 25% da população mojuense está na escola municipal e temos enviado muitos alunos para a rede estadual”, comemora a secretária de Educação. “O desafio é enviar a nossa população para o campus da universidade do Estados aqui em Moju, que hoje tem mais estudantes originários de cidades vizinhas e Belém”, aponta Sandra Lima.
O trabalho da Busca Ativa Escolar começa com um pente-fino nas matrículas de estudantes da rede municipal, onde avalia-se o quantitativo de alunos(as) que entram e saem de cada escola. Os centros educacionais precisam, todos os anos, aumentar o número de meninos e meninas que atendem, e isso passa por ir atrás das crianças, ou seja, pela Busca Ativa Escolar.
A Secretaria de Educação também construiu um passo a passo para as diretorias e coordenações de ensino colocarem em prática as ações de enfrentamento à evasão escolar. “Entregamos para cada escola uma cartilha que diz tudo sobre a Busca Ativa Escolar, o passo a passo do que deve ser feito desde o final do ano anterior até o final do ano letivo atual”, explica Dora Valente, assessora pedagógica da Semed.
“É um trabalho que passa pela acolhida das meninas e meninos matriculados na escola. Uma acolhida diferente, fora da sala de aula e que diga para os(as) alunos(as) que aquela é uma escola que está de braços abertos. Uma acolhida com brincadeiras, gincanas, teatro e música. Queremos que as crianças tenham o desejo de estudar lá até o final do ano”, detalha a pedagoga.
Posteriormente, são realizadas mobilizações das comunidades e, no decorrer do ano, visitas às casas dos estudantes com mais de três faltas seguidas ou que abandonaram os estudos. “No programa, há orientação de quando e como realizar cada etapa: matrícula, mobilização, acolhida e a busca dos(as) alunos(as) faltosos(as). São momentos diferentes dentro do Batelão e que ocorrem ao longo do ano para que a escola esteja sempre em alerta para que os(as) alunos(as) permaneçam com sucesso”, acrescenta Dora Valente.
Se a simples ligação ou a visita em domicílio não são suficientes para encontrar o estudante faltoso, as escolas entram em contato com outros entes do sistema de garantias de direitos e proteção de crianças e adolescentes, como as secretarias de Assistência Social e de Saúde, o Ministério Público e o Conselho Tutelar, para localizar e fazer retornar para a sala de aula. “Vale até recorrer às igrejas e aos meios de comunicação locais. O importante é localizar essas crianças e adolescentes em situação de evasão escolar”, ressalta Clenis Santiago.
Este ano, a Semed trata com o Ministério Público do Trabalho os casos de trabalho infantil que as escolas têm identificado. “À pedido do prefeito, vamos catalogar esses casos, a fim de compreender o problema e poder montar um plano de ação”, diz a secretária de Educação.
Desde 2021, os casos de evasão escolar são cadastrados e acompanhados na plataforma. “Queremos envolver cada vez mais os coordenadores educacionais no programa e, inclusive, no uso da plataforma. Temos uma diversidade interessante, e creio que isso vai nos ajudar, e muito, a otimizar o nosso trabalho”, projeta a coordenadora operacional da BAE em Moju.
Ela conta ainda que no pós-pandemia da Covid-19 havia mais de 4 mil meninos e meninas com baixa frequência escolar ou em situação de abandono escolar. O time da Busca Ativa Escolar em Moju arregaçou as mangas e mapeou esses estudantes. Segundo a coordenadora operacional, a maioria já migrou para a rede estadual, ou seja, está cursando ou concluindo o Ensino Médio.
Hoje, há pouco mais de 850 casos registrados na plataforma da BAE, sendo que em 97% deles os estudantes acompanhados seguiam dentro da escola. Ainda segundo os dados cadastrados no sistema, 48,2% dos casos de evasão escolar foram motivados pela falta de infraestrutura escolar e 33,8% porque sentem a escola desinteressante. Quase metade (46,8%) dos(as) alunos(as) faltosos(as) tinham mais de 18 anos.
“A logística é o nosso maior desafio para localizar os estudantes, porque ainda há território dentro do nosso espaço que ainda não conseguimos chegar lá, mesmo com nossas mais de 170 escolas distribuídas (pela cidade)”, avalia Sandra Lima. “Inclusive, temos uma escola com apenas dois alunos numa localidade de difícil acesso. A gente não tira a professora de lá para que essas crianças não fiquem sem escola”, comenta a secretária de Educação.
![]() Batelão da Educação: equipes educacionais nas ruas de Moju (PA) para mobilizar a comunidade para o início do ano letivo | Coordenadoras educacionais da Semed que concederam |
Batelões da Educação
As equipes gestoras dos centros de ensino também costumam organizar, no início de cada ano e de maneira descentralizada, caminhadas e carreatas nos bairros e comunidades de Moju para mobilizar a população com relação às matrículas de crianças e adolescentes e participar do início do ano letivo desde a primeira semana. Essas mobilizações também são as chamadas de Batelões da Educação (foto de destaque).
“Como o Dia D da Busca Ativa Escolar faz parte do calendário letivo, as escolas se articulam para realizar essas mobilizações. Às vezes, mais de duas escolas em bairros diferentes se unem para visitar as comunidades”, relata Clenis Santiago, coordenadora da Educação Infantil e coordenadora operacional da BAE no município.
Símbolo da Busca Ativa Escolar na cidade paraense, o batelão é uma barcaça para transporte de pessoas e carga e é muito usado pelos moradores para se deslocar, já que a região é banhada pelo Rio Moju, com 400 km de extensão, e seus afluentes. “Somos amazônidas, então, não podemos ter um carro como batelão, a gente tem um barco. Estamos na Amazônia mojuense, e aqui temos muitos rios e igarapés e é assim que a gente faz a Busca Ativa (com o batelão)”, conta a assessora pedagógica da Semed.
O município possui mais de 9 mil km² e a maior parte dos equipamentos públicos para a educação de crianças e adolescentes ficam em zonas rurais ou de difícil acesso. Apenas 20 colégios ficam em área urbana. O detalhe é que o centro administrativo da cidade fica próximo à cabeceira do rio. Isso significa que a Secretaria de Educação coordena escolas localizadas a 400 km de distância, ou seja, na ponta oposta do Rio Moju.
“Nós visitamos as crianças na própria comunidade, ligamos para os pais para identificar o que está acontecendo (em caso de ausência). Na última comunidade em que trabalhei, quase não havia celular, então, a solução era ir até a casa da família. E se não estiver lá (no endereço indicado na matrícula), tem que ver se alguém conhece, mandar recado. Enfim, é uma busca ativa mesmo, e tudo para nossos meninos e nossas meninas não ficarem fora da escola”, detalha a professora municipal Elaine Lima, que além de estar em sala de aula também coordena 10 escolas dentro da Semed. A docente usou a camiseta da iniciativa “Fora da escola, não pode!” na entrega da premiação Selo Nacional Compromisso com a Alfabetização.
Por conta das características do setor produtivo local, a região de Moju tem muitos trabalhos sazonais, e não é raro que as famílias com crianças e adolescentes deixem o município repentinamente sem comunicar as escolas da mudança. Como é uma região propícia para o cultivo da palma, há muitos empreendimentos que produzem dendê para ser usado como matéria-prima de biodiesel e também uma larga produção de açaí e coco. Além disso, muitas crianças e adolescentes acabam se ausentando das aulas no período de colheita. “Essas faltas impactam na aprendizagem e desenvolvimento desses meninos e meninas”, afirma Dora Valente.
“Mais de 70% das famílias dos nossos alunos são cadastradas no CadÚnico. Trabalhamos para oferecer a essa população o que lhe é de direito: educação de qualidade com equidade e que ela não precise ir para a sede do município para estudar, porque lá onde mora com a sua família tem sim uma escola de qualidade”, afirma a responsável pela Semed.
Fotos: Semed Moju/PA